

Fotografia Rafaela Arraes
“O meu tabuleiro é pra me distrair,” diz Nani. “Sou aposentado, tenho uma reserva do Exército... E amo a vida. Amo viver. Aqui na Lapa, atendo de tudo quanto é gente, de japonês a amazonense. E assim vou preenchendo meu tempo. Já estou aqui há seis anos, sempre no mesmo cantinho.” Apesar de gostar muito do que faz atualmente, trabalhar na Lapa, para Nani, não foi algo planejado. “Foi um acidente de percurso. Quando voltei pro Rio, acabei vindo morar aqui na Rua das Marrecas, e de lá pra cá eu levo cinco, seis minutos, a pé. Não preciso de ônibus, de metrô, de nada”, conta ele.
Conforme a noite vai avançando, o movimento na Lapa vai aumentando cada vez mais. O horário de pico dos bares é entre onze horas e duas da manhã, e as boates costumam ter programação com shows e DJs até o sol raiar. Com toda sua variedade, das atrações ao cardápio – e principalmente, de gente –, não há dúvidas de que, mais que uma boa pedida, a Lapa é parada obrigatória na programação do fim de semana de quem quer conhecer um ambiente tipicamente carioca.
Lapa
E pra fechar o sábado, nada melhor que a tradicional boemia da Lapa. Do happy hour às primeiras horas da manhã de domingo, o que não falta nessa área são opções para passar o tempo e dar aquela relaxada depois do agito da semana. São bares, boates e restaurantes para atender a um variado público.
Apesar de alguns bares funcionarem durante o horário de almoço, o forte da Lapa mesmo é a noite. Nosso ponto escolhido foi a Avenida Mem de Sá, uma das principais ruas da região, localizada bem atrás dos Arcos da Lapa. O visual é contagiante: logo ao atravessar os arcos, pode-se ver uma longa rua tomada pelas mais diferentes tribos, de todas as idades e lugares do mundo, reunidas num só espaço com uma única intenção: se divertir.
Essa diversidade é uma das principais características da Lapa, e com certeza, é o que torna o local tão singular. “É muito diferente de tudo que eu já tinha conhecido, em todos os países que eu visitei até hoje. É realmente incrível, não dá pra acreditar que é mesmo assim só pelas fotos na internet”, diz a turista holandesa Adelheid Berniss, de passeio pela Cidade Maravilhosa há uma semana. Em sua primeira noite na Lapa, Heidi – como prefere ser chamada – já afirmou fazer questão de voltar pelo menos mais uma vez antes de deixar o Rio.
Várias boates investem em iluminação colorida nas fachadas dos prédios, e o contraste de luzes e cores, somado a risadas, cantorias, fragmentos de conversas e sotaques e idiomas, caracteriza o ambiente que é a cara da Lapa. Apesar dos horários irregulares de quem trabalha no local, a possibilidade de ver gente diferente e coisas novas a cada dia dá um ânimo pra enfrentar a falta de rotina.
O cearense Paulo Rosa, por exemplo – 33 anos, seis de Lapa –, trabalha no Antonio’s como gerente geral. Na esquina com a Rua do Lavradio, o bar se encontra em uma posição estratégica entre duas ruas de grande movimento noturno da região. Paulo conta que a maioria dos clientes aprecia frequentar os bares da Lapa em busca de petiscos e bebidas diferentes, sim, mas mais que isso, em busca do clima boêmio que dá a fama ao local.

“O pessoal gosta muito de vir comer, pra fazer o aquecimento antes do show, e depois do show, pra matar a fome”, brinca o gerente. O Antonio’s trabalha com shows ao vivo, como a maioria dos bares da Mem de Sá – no geral, o repertório é baseado em rodas de samba, mas há espaço também para salsa e forró no Levianos, um pouco de hip hop e black no Teatro Odisseia e aquela dose de rock no La Esquina. O Circo Voador, palco de grandes apresentações no auge do rock nacional, ainda se mantém funcionando, embora com uma programação mais variada e alternativa do que nas décadas passadas.
Logo em frente ao Circo Voador, aliás, começam a surgir as barraquinhas de comida e bebida, tão comuns aqui no Brasil. Pizza, hambúrguer, cachorro-quente, yakisoba, salsichão... As opções são várias pra quem está com o orçamento mais apertado, mas quer curtir o clima da Lapa mesmo assim. As barraquinhas que vendem caipirinha são outras que raramente estão sem fila. Logo abaixo dos arcos, na curva pela qual passa a Mem de Sá, é comum ter intervenções artísticas de trupes regionais de dança, canto ou teatro, que se apresentam de forma independente em troca de uma graninha pra poder seguir com o pé na estrada.
Algumas pessoas, de tão populares, se tornam a cara do lugar. O aposentado Ernani Costa Alecrim Filho – “mais conhecido no pedaço como Nani Love!”, ressalta ele – já é figurinha carimbada do início da Mem de Sá, destacando-se por sua simpatia e sua atenção ao tratar os clientes. Nani trabalha vendendo doces e cigarros na rua, e a partir das sete da noite, de segunda a domingo, é certeza: só olhar pra frente do posto de gasolina, logo depois do Circo Voador, e o simpático senhor estará lá, com seu tabuleiro e seu boné do Corinthians, sorrindo e contando histórias entre uma venda e outra. Carioca de nascença, com passagens por Recife e São Paulo ao longo de seus 73 anos, o que não falta a ele, realmente, é história pra contar.

Fotografia Rafaela Arraes
Fotografia Rafaela Arraes
Vídeo Rafaela Arraes